Durante esses dias que se passaram deste terrível acidente, pensei bastante e resolvi escrever um pouco sobre o ocorrido em relação ao Seguro Aeronáutico.
Logicamente não estou aqui para apontar causas nem fazer análise do ocorrido, e sim apenas levantar alguns pontos que nós, da VOKAN, lidamos no dia a dia e que vem à tona no momento de um acidente com a lamentável perda de 5 vidas.
Atualmente, existem 3 tipos de seguros que envolvem a operação de uma aeronave, são eles:
- Seguro RETA, seguro obrigatório para qualquer aeronave que voa em solo brasileiro e que é destinado a terceiros. Este seguro tem um valor de indenização padrão fixado por assento que é atualizado anualmente, bem como um limite tabelado de acordo com o Peso Máximo da Aeronave para danos que a aeronave causar em solo (materiais e corporais). O limite atualmente fixado por assento é de R$ 83.573,62 (tanto para tripulante quanto para passageiro).
- Seguro Casco – seguro que cobre os danos causados a aeronave e que serão indenizados ao proprietário, para que ele possa fazer a aquisição de outra aeronave nas mesmas condições de valor da aeronave acidentada (em caso de perda total), ou o reparo de sua aeronave. Uma cobertura adicional muito importante é a de Remoção de Destroços, visto que é de responsabilidade do operador da aeronave remover os destroços do local do acidente, assim como, dar um destino a eles. No caso do PT-ONJ, imagino que será consumido o valor total da cobertura Casco e também da cobertura de remoção de destroços, tendo em vista o local remoto da queda da aeronave e os altos custos da operação de remoção dos destroços que será necessária.
- Seguro Responsabilidade Civil (LUC) – este é, na minha opinião, o seguro mais importante para qualquer operador de aeronave. Pois este seguro irá cobrir os danos causados às vítimas do acidente (terceiros a bordo ou em solo). Trata-se de um seguro de responsabilidade civil em excesso ao Seguro RETA (item 1 acima) onde o cliente pode escolher o limite de cobertura que deseja contratar. Além disso, ao contratá-lo, o segurado terá todo apoio jurídico de advogados especialistas no tema durante o processo de regulação do sinistro aeronáutico.
Vou me prolongar sobre o Seguro LUC (item 3 acima) pois é o ponto que quero levantar a reflexão a todos os operadores de aeronave do país, para que não economizem nesta cobertura na renovação dos seguros de suas aeronaves.
Por incrível que pareça, tem muitos operadores que voam no Brasil somente com o Seguro RETA que é obrigatório. Não há hoje nenhuma obrigatoriedade de contratação de Seguro Casco e nem de Seguro LUC. No Entanto, como vimos acima, o seguro RETA possui um limite de indenização extremamente baixo, o que, na maioria das vezes, não é suficiente para cobrir os danos causados.
Existem muitos clientes também que se preocupam em proteger somente o seu bem (aeronave) e fazem a contratação apenas do seguro RETA + Seguro Casco. Parece meio estranho, mas é assim que funciona e muitas pessoas não fazem a contratação da cobertura LUC, que ressalto novamente, é a mais importante cobertura do seguro aeronáutico, na minha opinião. Todo operador de aeronave sabe quanto vale seu bem e se está disposto a correr riscos em caso de acidente, pois sabe exatamente quanto ela vale e quanto será perdido em caso de acidente com a máquina.
Mas e todos os riscos de responsabilidade civil que envolvem uma operação aeronáutica? Será que é possível mensurá-los? Logicamente que não!!! Ninguém imagina ou pensa que sua aeronave vai sofrer algum acidente, e simplesmente é impossível de prever quem estará a bordo, onde essa aeronave vai se acidentar, quem ou o que ela vai atingir durante sua queda, entre outros fatores. Por isso, aqui na VOKAN, temos como regra oferecer a 100% dos nossos clientes o seguro LUC (que somente pode ser contratado em conjunto com o seguro Casco) e principalmente explicar a importância desta cobertura.
Já tivemos muito sucesso nesse tipo de conscientização, mas ainda temos muitos clientes que optam por pagar mais barato no seguro e deixar essa cobertura de fora, ou até mesmo contratam um limite baixo que não será suficiente em caso de acidente envolvendo terceiros.
O Seguro LUC pode ser contratado com qualquer valor que o cliente escolher. O custo desta cobertura LUC é muito baixo tendo em vista tudo que ela cobre. Por exemplo, um seguro LUC de USD 5.000.000,00 custa em torno de USD 6.500,00 anualmente. Enquanto um seguro LUC de USD 50.000.000,00 (10x a mais de cobertura que o exemplo acima), tem custo anual de USD 17.500,00 (aprox. 2.5x mais caro que o exemplo acima). Ou seja, o aumento da cobertura não caracteriza o mesmo aumento no valor a ser pago.
Aqui na VOKAN, por exemplo, nós temos clientes com cobertura LUC contratada de até USD 250.000.000,00 (isso mesmo, mais de R$ 1 bilhão de Reais).
Então lhes faço uma pergunta: Quanto valia a vida das 5 pessoas a bordo do PT-ONJ? Certamente não há uma resposta para essa pergunta, porém, a justiça e os advogados têm uma forma de fazer um cálculo do valor da indenização de uma vítima em acidente aéreo. Fatores como idade, salário, filhos, expectativa de vida, são levados em conta neste cálculo. Em se tratando de uma cantora famosa, de 26 anos e, certamente, rendimentos mensais superiores a R$ 10.000.000,00, qual será o valor desta indenização??
Não precisamos ir muito longe para também lembrarmos de outros acidentes onde, certamente, o limite de responsabilidade civil contratado não foi suficiente para as indenizações necessárias (NOAR táxi aéreo e o caso da LAMIA, com os jogadores da chapecoense que vem sendo um case envolvendo o mercado segurador mundial).
Meu objetivo principal (diário em cada negociação com nossos clientes e também com este texto) é conscientizar os operadores da importância da contratação correta desta cobertura, pensando sempre em todos os cenários possíveis para proteção de terceiros e, principalmente, do segurado. Pois se não tiver seguro LUC ou tiver uma apólice com limite baixo, certamente a indenização terá que ser paga com capital próprio do segurado ou de seus sócios, em caso de pessoa jurídica.
O problema não se trata apenas de uma contratação errada de seguro, é algo, na minha opinião, muito maior que isso. As autoridades brasileiras deveriam exigir que todo operador de aeronaves tivesse uma apólice com um limite razoável para cobertura de terceiros, ou então, alterar para que o Seguro RETA tivesse valores de cobertura minimamente satisfatórios.
A cada acidente que acontece, esse assunto do baixo limite do RETA volta a ser discutido, porém, nada é alterado.
Enquanto isso não mudar, infelizmente muitas famílias seguirão desamparadas quando perderem parentes em acidentes aéreos.
Termino aqui deixando meus sinceros sentimentos a todos os familiares que perderam seus entes queridos.
Quando um sai da rota, todos sentem!!